As Feiticeiras por Maria Teresa Horta
capa da edição da Actes Sud
Um poema de Maria Teresa Horta e a partitura que sobre ele criou António Chagas Rosa deram origem a “Les Sorciéres/Feiticeiras”, obra ouvida em França e agora editada pela Actes Sud em edição bilingue. O suplemento do Diário de Noticias, 6ª (19 de Janeiro de 2007), publicou um artigo sobre esta edição. Para tal, Ana Marques Gastão e Bernardo Mariano conversaram com os autores. Maria Teresa Horta voltou a falar sobre As Feiticeiras de Jules Michelet:
«As feiticeiras tinham poderes de compaixão, de curar, o trato com as ervas e as flores. Eram as parteiras da aldeia, os médicos do povo. Daí advinha a sua força.»«Michelet dizia no séc. XVIII que as feiticeiras eram muito importantes e que a Inquisição, queimando-as, deixou aldeias vazias. Muitas mulheres diziam ser feiticeiras não sendo, porque era uma forma de aceder a uma identidade própria»
«As feiticeiras tinham poderes de compaixão, de curar, o trato com as ervas e as flores. Eram as parteiras da aldeia, os médicos do povo. Daí advinha a sua força.»«Michelet dizia no séc. XVIII que as feiticeiras eram muito importantes e que a Inquisição, queimando-as, deixou aldeias vazias. Muitas mulheres diziam ser feiticeiras não sendo, porque era uma forma de aceder a uma identidade própria»
Fernando Ribeiro de Mello editou em 1974 o clássico de Michelet, com quatro comentários. Um desses escritos, intitulado As Mulheres: Feiticeiras é de Maria Teresa Horta, do qual aqui recordamos alguns excertos:
«Pediram-me um texto para acompanhar, entre outros, a tradução para português de «A Feiticeira» (sic) de Michelet: e pediram-me esse texto, porque sou feminista: feminista militante, doa a quem doer, sejam quais forem as pedradas que receba nas costas. – É, pois, como feminista que aqui deixarei o meu testemunho, testemunho não propriamente sobre o texto (admirável) de Michelet e seu maior ou menor valor literário, mas somente, testemunho, ou antes: chamada de atenção para a singularíssima figura das feiticeiras e seus lúdicos grupos, mágicas maneiras de evasão da sociedade; mundo, universo que as oprimia, as subjugava... Mansamente as destruía: mulheres uma a uma, em suas casas, cabanas, grutas, castelos, conventos: universo de todas nós e que só a nós diz respeito. Nossas prisões por vezes tecidas a fio de seda; grades e grades de ouro... mas não só.»
«...as feiticeiras, primeiras mulheres, primeiros grupos de mulheres para quem olhou o mundo. E sobre elas o mundo debruçou seu poder de macho, destruindo-as.»
«Ao se assumir feiticeira, ganhava a mulher um estatuto, uma força, que a ordem social sempre lhe negara. Ao se afirmar feiticeira, ao se entregar até às práticas ocultas, recusava a mulher a vida que lhe era imposta. Ao entrar em êxtase, atingia ela uma realização que lhe era proibida como mulher.»«Mas outras mulheres viriam, ainda: nós as feministas...
- As feiticeiras – as sufragistas... –
Nós: grupos de mulheres e grupos de mulheres, gritando pelo mundo o uso que se tem feito de nossos corpos e vontade; de nossas vidas e verdadeira personalidade.»
«Eis o que tem sido feito e se continua hoje ainda fazer à mulher (que outra coisa entre tantas outras, a proibição do aborto legal?).»M.T.H.
Lisboa, 29-10-1974
Bold nosso
«Pediram-me um texto para acompanhar, entre outros, a tradução para português de «A Feiticeira» (sic) de Michelet: e pediram-me esse texto, porque sou feminista: feminista militante, doa a quem doer, sejam quais forem as pedradas que receba nas costas. – É, pois, como feminista que aqui deixarei o meu testemunho, testemunho não propriamente sobre o texto (admirável) de Michelet e seu maior ou menor valor literário, mas somente, testemunho, ou antes: chamada de atenção para a singularíssima figura das feiticeiras e seus lúdicos grupos, mágicas maneiras de evasão da sociedade; mundo, universo que as oprimia, as subjugava... Mansamente as destruía: mulheres uma a uma, em suas casas, cabanas, grutas, castelos, conventos: universo de todas nós e que só a nós diz respeito. Nossas prisões por vezes tecidas a fio de seda; grades e grades de ouro... mas não só.»
«...as feiticeiras, primeiras mulheres, primeiros grupos de mulheres para quem olhou o mundo. E sobre elas o mundo debruçou seu poder de macho, destruindo-as.»
«Ao se assumir feiticeira, ganhava a mulher um estatuto, uma força, que a ordem social sempre lhe negara. Ao se afirmar feiticeira, ao se entregar até às práticas ocultas, recusava a mulher a vida que lhe era imposta. Ao entrar em êxtase, atingia ela uma realização que lhe era proibida como mulher.»«Mas outras mulheres viriam, ainda: nós as feministas...
- As feiticeiras – as sufragistas... –
Nós: grupos de mulheres e grupos de mulheres, gritando pelo mundo o uso que se tem feito de nossos corpos e vontade; de nossas vidas e verdadeira personalidade.»
«Eis o que tem sido feito e se continua hoje ainda fazer à mulher (que outra coisa entre tantas outras, a proibição do aborto legal?).»M.T.H.
Lisboa, 29-10-1974
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