Prefácio de Cara Lh Amas
Apresentamos a primeira parte do excelente prefácio à edição de CARA LH AMAS, escrito pelo próprio E. M. de Melo e Castro (na foto).
Prefácio
1. Sobre as transformações do título deste livro
Chamei-lhe CARA LHA AMAS quando por volta de 1964 reuni alguns poemas que em comum tinham um certo tratamento de uma certa linguagem. E assim foi referido na «Antologia da Poesia Erótica e Satírica», onde alguns desses poemas foram publicados. Para mais rigorosa informação do Leitor transcrevo a nota que então deveria abrir o livro em projecto e explicava o título.
«Se se chama ´Ideograma` ao sinal gráfico e visual de uma ideia, pode chamar-se ´cara lh amas` à grafia ou visualização que aqui se faz de um conhecido sujeito de que certamente todos, por variadas razões, lhe amam a cara.»
e então, no ambiente eroticamente obscuro e repressivo dessa «longínqua» data, o título tinha toda a justificação numa função de choque e de (re)descoberta das enormes potencialidades criativas de um vocabulário maldito
Também era o começo de uma euforia experimental que nas palavras encontrava sentidos e significados interiores insuspeitados pelo uso fúnebre e rotineiro que delas faziam certas pessoas. CARA LH AMAS era, portanto, o título justo a, pelo menos, dois níveis: o propriamente erótico e o linguístico experimental.
No entanto o livro (que ia crescendo organicamente) não podia obviamente ser publicado. Apenas ficou na mente de alguns amigos e especialistas e a existência de tal título e de tal projecto de publicação na Afrodite-Fernando Ribeiro de Mello, claro.
Mas quando esse projecto se pôde começar a concretizar receei que a força desmistificante de CARA LH AMAS tivesse diminuído precisamente nos 2 níveis que o justificavam: o erótico, por um actual maior à-vontade de comportamento e linguagem; o experimental, porque tais exercícios semânticos já haviam sido assimilados pelos leitores e são hoje parte da linguagem falada de muita gente.
Havia que procurar outro título. Foi então que de uma conversa com José Martins Garcia, sobre os «Anagramas de Eros» em Ricardo Reis me surgiu: «OS ERROS DE EROS». Título que me satisfez plenamente pela subtileza: da ambiguidade moralista de «erros» à clareza da invocação de «eros» medeia apenas o eliminar de uma consoante e a consequente alteração fónica ou, fonologicamente uma simples oposição.
Estava nisto quando surgiu Liberto Cruz que propõe: «OS ERROS DE CARA» título a todos os títulos mais complexo e mais rico em subtilezas ainda. È que «eros» está graficamente contido em «erros» e CARA é sem dúvida uma palavra plena de conotações mais diversas, desde ser a primeira parte de CARA LH AMAS, até aludir a uma frase popular, como por exemplo «é de caras». Por outro lado o ser «de» (proposição apenas) e não «do» aumenta a carga semântica total, por indeterminar ainda mais as conotações de cara. Assim, cheguei a um título que revelava uma maturidade emocional/linguístca, mas que era «pouco título».
A força original de «cara lh amas» voltou a impor-se durante uma conversa com Helder Macedo, já que tal título pode agora ter ainda um outra leitura que se ajusta optimamente ao tom geral do livro, ou seja, o de um humor/sarcasmo sobre a sua própria natureza.
Além disso uma história contada por Helder Macedo contribuiu decisivamente para o retorno ao título primitivo: «durante um ensaio num teatro de Lisboa, no meio de acalorada discussão, alguém gritou a plenos pulmões. «Em português todas as palavras querem dizer CARALHO».
Perante tal evidência linguística, que outro título poderia ser escolhido?
- Eis como um círculo de erudição se fecha sobre a realidade primeira e última de um amor que «é de caras»...
1. Sobre as transformações do título deste livro
Chamei-lhe CARA LHA AMAS quando por volta de 1964 reuni alguns poemas que em comum tinham um certo tratamento de uma certa linguagem. E assim foi referido na «Antologia da Poesia Erótica e Satírica», onde alguns desses poemas foram publicados. Para mais rigorosa informação do Leitor transcrevo a nota que então deveria abrir o livro em projecto e explicava o título.
«Se se chama ´Ideograma` ao sinal gráfico e visual de uma ideia, pode chamar-se ´cara lh amas` à grafia ou visualização que aqui se faz de um conhecido sujeito de que certamente todos, por variadas razões, lhe amam a cara.»
e então, no ambiente eroticamente obscuro e repressivo dessa «longínqua» data, o título tinha toda a justificação numa função de choque e de (re)descoberta das enormes potencialidades criativas de um vocabulário maldito
Também era o começo de uma euforia experimental que nas palavras encontrava sentidos e significados interiores insuspeitados pelo uso fúnebre e rotineiro que delas faziam certas pessoas. CARA LH AMAS era, portanto, o título justo a, pelo menos, dois níveis: o propriamente erótico e o linguístico experimental.
No entanto o livro (que ia crescendo organicamente) não podia obviamente ser publicado. Apenas ficou na mente de alguns amigos e especialistas e a existência de tal título e de tal projecto de publicação na Afrodite-Fernando Ribeiro de Mello, claro.
Mas quando esse projecto se pôde começar a concretizar receei que a força desmistificante de CARA LH AMAS tivesse diminuído precisamente nos 2 níveis que o justificavam: o erótico, por um actual maior à-vontade de comportamento e linguagem; o experimental, porque tais exercícios semânticos já haviam sido assimilados pelos leitores e são hoje parte da linguagem falada de muita gente.
Havia que procurar outro título. Foi então que de uma conversa com José Martins Garcia, sobre os «Anagramas de Eros» em Ricardo Reis me surgiu: «OS ERROS DE EROS». Título que me satisfez plenamente pela subtileza: da ambiguidade moralista de «erros» à clareza da invocação de «eros» medeia apenas o eliminar de uma consoante e a consequente alteração fónica ou, fonologicamente uma simples oposição.
Estava nisto quando surgiu Liberto Cruz que propõe: «OS ERROS DE CARA» título a todos os títulos mais complexo e mais rico em subtilezas ainda. È que «eros» está graficamente contido em «erros» e CARA é sem dúvida uma palavra plena de conotações mais diversas, desde ser a primeira parte de CARA LH AMAS, até aludir a uma frase popular, como por exemplo «é de caras». Por outro lado o ser «de» (proposição apenas) e não «do» aumenta a carga semântica total, por indeterminar ainda mais as conotações de cara. Assim, cheguei a um título que revelava uma maturidade emocional/linguístca, mas que era «pouco título».
A força original de «cara lh amas» voltou a impor-se durante uma conversa com Helder Macedo, já que tal título pode agora ter ainda um outra leitura que se ajusta optimamente ao tom geral do livro, ou seja, o de um humor/sarcasmo sobre a sua própria natureza.
Além disso uma história contada por Helder Macedo contribuiu decisivamente para o retorno ao título primitivo: «durante um ensaio num teatro de Lisboa, no meio de acalorada discussão, alguém gritou a plenos pulmões. «Em português todas as palavras querem dizer CARALHO».
Perante tal evidência linguística, que outro título poderia ser escolhido?
- Eis como um círculo de erudição se fecha sobre a realidade primeira e última de um amor que «é de caras»...
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