Wednesday, October 02, 2013

O Purgatório dos Poetas


 
Aqui encontrámos um texto de Isabel Cadete Novais sobre a edição da Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, de Natália Correia (foto). Segundo a autora, a edição levada a afeito por Natália Correia e Fernando Ribeiro de Mello, teve génese numa ideia, num projecto de Manuel Cardoso Marta. Natália Correia aproveitou e deu continuidade ao projeto de um amigo de longa data, designado «O Purgatório dos Poetas», após lhe ter comprado a sua vasta biblioteca, incluindo alguns papéis do seu espólio literário.

«O Purgatório dos Poetas» permaneceu interrompido na posse de Manuel Cardoso Marta durante vinte e três anos, e, só após a sua morte, foi parcialmente recuperado por Natália Correia, ao integrá-lo num projecto seu, mais extenso, intitulado Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica: dos cancioneiros medievais à actualidade, publicado pelas edições Afrodite em 1966.”

“O dossiê de trabalho do referido projecto parece ter chegado até hoje praticamente como Cardoso Marta o deixou: uma capa cartonada com o rótulo autógrafo «O Purgatório dos Poetas» reúne, sob a folha de rosto (contendo título, autoria, esboço de desenho, local e data), um índice geral dos conteúdos, uma recolha autógrafa de trinta e oito poemas, dois dactiloscritos e, ainda, seis páginas de rascunho de um texto explicativo com características de prefácio. Deixadas no dossiê, uma dezena de folhas em branco indiciam que o trabalho foi suspenso numa fase em que se previa a inclusão de mais textos.”

“O cotejo entre os papéis de Cardoso Marta e a Antologia publicada por Natália Correia conduz-nos à conclusão de que o projecto daquele estudioso terá sido usado como tema ou ponto de partida para a exaustiva e arrojada edição que, segundo a própria autora, teve como «motivo determinante da sua publicação, constituir ao tempo essa obra uma “pedrada no charco” de um puritanismo que funcionava como uma das armas da repressão instituída». Como seria de prever, o acto de rebeldia contra o regime acabou por custar uma passagem efémera pelos escaparates das livrarias, tendo a edição sido retirada do mercado e os seus responsáveis condenados em Tribunal Plenário.”