Wednesday, September 27, 2006

A Alice da Ana

A Ana Gomes Ferreira enviou-nos fotos do seu exemplar das Aventuras de Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. 
É a edição (2ª?) "arco-íris", com páginas coloridas. Agradecemos, pois cá por casa, mora apenas um exemplar da primeira edição.
Qual delas a mais bonita?




Saturday, September 23, 2006

De Fora Para Dentro – Alguns apartes

ROGER VAILLAND: “Entre 1904 e 1914, entre os seus vinte e trinta anos, viajara nas férias universitárias por toda a Europa a fim de rematar a educação, segundo o desejo do pai. Voltando certo verão de Londres para em Valência embarcar rumo a Nápoles, demorou-se alguns dias em Portugal. Fizera a si mesmo mil perguntas sobre o declínio desta nação cujo império se alargara a todo o globo. Conheceu escritores que não escreviam para ninguém; homens políticos que governavam para os ingleses; homens de negócios que liquidavam as feitorias do Brasil, e viviam das rendas exíguas nas cidades da província, sem qualquer objectivo. Concluiu que a pior das desgraças era nascer português. Em Lisboa e pela primeira vez na vida travara encontro com um povo que se tinha desinteressado.” (A Lei)


HENRY MILLER: “Diz (o meu amigo Rivas) que os Portugueses são caricatura dos Espanhóis – mas produziram uma bela literatura!” (cartas a Anais Nïn – 4/8/41)


CHARLES BAUDELAIRE: “Diz lá, minha alma, ó minha pobre alma arrefecida, que acharias tu de viver em Lisboa? Lá deve fazer calor, e com isso haverias de regalar-te como qualquer lagarto. A cidade é à beira d´água; diz-se que é construída em mámore e o povo odeia os vegetais a um ponto que tal que arranca todas as árvores. Ora aí tens uma paisagem a teu gosto, uma paisagem feita de luz e mineral com líquido a oferecer-lhes o seu frescor!” (Any where out of the world – O spleen de Paris)


CASANOVA: “- (…) Depois de saber que sois portuguesa, sinto-me reconciliado com a vossa nação. – Porquê, não gostáveis de nós? – Queria-vos mal porque há duzentos anos deixastes morrer o vosso Virgílio na miséria. – Camões! Mas antes de nós fizeram os Gregos o erro de deixar morrer o seu Homero. – É verdade; porém os erros de uns nãos desculpam os dos outros.” (Memórias)


HANS CHRISTIAN ANDERSEN: “O africano de feições grosseiras, lábios espessos e negra carapinha felpuda está sentado nos degraus palácio de mármore da capital de Portugal, e mendiga...É o fiel escravo de Camões; sem ele e as moedas que lhe deitam, teria morrido de fome o seu senhor, o cantor de Os Lusíadas. Mas hoje cobre o túmulo de Camões um sumptuoso monumento.” (Contos)

Wednesday, September 20, 2006

De Fora Para Dentro

edição de Março de 1973

Colecção Antologia
Organização, notas e tradução de Aníbal Fernandes
Capa, fotografia e arranjo gráfico de abertura de Jorge Costa Martins
Edição com algumas imagens de D. Affonso I, nun`álvares, infante d. henrique, marquês de pombal, afonso costa, cardeal cerejeira, salazar e marcelo caetano.
Antologiados: andré mandiargues, blaise cendrars, byron, d. a. f. de sade, françois de chateaubriand, jean giraudoux, jules supervielle, jules verne, miguel de cervantes, miguel de unamuno, paul morand, philippe soupault, reynaldo arenas, saint-exupéry, sedar senghor, simone de beauvoir, thomas mann, thomas owen, william beckford, valéry larbaud, vercors, volaire
Autores de Apartes: alberto candeias, andré bay, andré maurois, aquilino ribeiro, armand guilbert, boyd alexander, byron, domingos monteiro, casanova, chamfort, charles baudelaire, donatien-alphonse-françois de sade, erich maria remarque, folclore de trinidad, georg christoph lichtenberg, hans christian andersen, henry miller, jean-pierre giraudoux, josé rodrigues miguéis, link, robert desnos, roger vailland, simone de beauvoir, william saroyan, victor-henry debidour, vitorino nemésio, voltaire.


Texto na badanaCervantes e Unamuno escreveram (eram espanhóis) sobre Portugal. Mas o Marquês de Sade também. Portugal foi tema para a épica de Lord Byron e a lírica de Cendrars. Thomas Mann viu à sua maneira a paisagem deste último país da Europa que Simone de Beauvoir também retrataria clara e sucintamente.

Até Chauteaubriand escreveu sobre Portugal. E as voltas ao mundo da literatura de Verne passam irresistivelmente por Portugal.

Um país de fome e/ou monumentos? uma Lisboa pedinte e/ou de seculares procissões? um português piolhoso e/ou cantor do fado? um clima propício às pulgas e/ou aos banhos de mar? O que é que mais ressalta deste retrato de Portugal visto de fora?

Eis uma boa razão para lermos estes escritores estrangeiros e lhes agradecermos o terem escrito o que nós não temos vontade, capacidade ou licença para vermos. Ou temos? É ler! Essa é a melhor forma de sermos dignos da atenção que alguns génios da humanidade se deram ao trabalho de nos prestar, sem disso terem necessidade.

E se alguns destes textos são antigos nem assim são velhos: Lisboa continuará a não ter a dignidade de uma capital – como dizia Beckford em 1787? E, como dizia Lord Byron, Lisboa não contém mais que ruelas desagradáveis e habitantes mais desagradáveis ainda? Unamuno teria ainda hoje mil razões para desabafar: “Pobre Portugal!”?

Portugal, “onde um guindaste parece um canhão de longo alcance”(Cendrars).
“...onde nem uma esmola se pode pedir em voz alta” (Reynaldo Arenas).
“...uma nojice! – Porquê? – Por Tudo!” (Simone de Beauvoir).

Parciais ou imparciais, distanciadas ou não no tempo, estas e outras opiniões destes escritores aí ficam. É com eles e com os senhores leitores.

Saturday, September 16, 2006

Luiz Pacheco escreveu - II

“Voltando ao Ribeiro de Mello: ele já anda a preparar uma antologia de prosa erótica e na sexta que passei em Lisboa veio cá a casa comprar-me tudo o que houvesse meu. A Irene não vendeu, porque não percebeu o que ele queria. E esta m/ súbita edição de OS NAMORADOS também se destinou a evitar que ele os meta na tal antologia, sem me dar cavaco. E requeimando o texto, que projectava refundir para os Textos Locais.
Gostaria de fazer o tal prefácio, que seria muito menos sobre o SADE que sobre o David-anti sade… E a oferta é tentadora. Remetendo-o (ao Mello) para si e Edite, creio no entanto ter procedido da melhor maneira. Da que, agora, me parece honesta e legítima. Declarando à Natália, não por quixotismo mas por camaradagem desafiante, que estaria com ela no que houvesse com ela em relação à anterior antologia (onde colaborei a brincar e só por causa dela – em atenção a muitas outras coisas, por ex. o crianço meu que ela tem lá em casa) julgo manter uma atitude de coerência para a qual acato o v/ conselho de amigos mas não me era exigida a v/ digamos autorização. A escalada, de que falo ao Mello (aqui entre nós, a pressa fabricante deste tipo, uma espécie de Aguiar & Dias dos erotismo clássicos, aliás, foi o Vítor mesmo que me disse que a tradução do Kama Sutra era abominável e pelo preço um crime de pura especulação; não assim com a Antologia, que me cheira edição de nível) tencionava fazê-la com os Textos Locais.”
Excerto de carta (sem data) de Luiz Pacheco a Vítor Silva Tavares.

“Mas, podia deixar escapar esta réstea de liberdade que é a Afrodite, onde se escreve aquilo que se quer? Não tenho pelo Ribeiro de Mello nenhuma simpatia especial, e até fortes suspeitas das motivações íntimas da sua actividade editora. Mas o certo o certo é que ele fez em poucos meses o que eu não consegui em vinte anos (nota, não editaria o Kama Sutra como ele, nem iria naquela velocidade em que ele vai; mas mal ou bem, como eu não gostaria de fazer mas fazendo como pode, o FRM está desempenhar uma função). E, sintoma alegre: isso indica falhas no sistema; tipografias com mais tomates; dinheiro a sério; uma equipa. Um entusiasmo inegável. Por tudo, ele merece ser ajudado; merece que se lhe corresponda à coragem com coragem e ao atrevimento com mais atrevimento. Foi o que fiz. Nem estou arrependido. Mas chega uma hora de avaliar as consequências, prever as ressacas provindo dos nossos actos.”
Excerto de carta (sem data) de Luiz Pacheco a Mário Cesariny de Vasconcelos.
Cartas em: Pacheco Versus Cesariny, Folhetim de Ficção Epistolográfica, Editorial Estampa, 1974.

Monday, September 11, 2006

Revolucionários e Querubins, de José Martins Garcia

edição de Janeiro de 1977

José Martins Garcia
Colecção: Autores II
Capa: Nuno Amorim, figuras da capa a partir do cartaz “Povo MFA”
Edição e arranjo gráfico: Edições Afrodite


Texto na contracapa

Antes da cobardia, o pânico. Com o pânico, a corrida em busca de segurança.
Os partidos “progressistas” abrem as portas a uma multidão inqualificável. Os mais culpados transformam-se nos mais fanáticos militantes do novo credo. Picada por insectos desenfreados, a ”esquerda” incha, sem conteúdo, e estala por todos os lados.
“Revolucionários e Querubins” denuncia – com base na experiência do que foi a perseguição movida aos velhos antifascistas pelos neófitos – a imoralidade de uma revolução imaginária. O leitor talvez possa reconhecer, porém, em muitas das personagens aqui apresentadas alguns dos mais vibrantes arautos da canalhice vigente nestes últimos dois anos de vida nacional.
Fábulas, apólogos e parábolas são aqui produtos imaginários duma revolução imaginária. E se, no plano político, uma revolução imaginária é uma revolução traída, o imaginário, no campo da literatura, constitui uma denúncia legítima. Se bem que, em matéria de cobardes e traidores, a realidade portuguesa ultrapasse a ficção...

Wednesday, September 06, 2006

O Editor na Banheira

O Almocreve das Petas escreveu sobre esta página e enviou-nos um texto.
O que, na altura, se escreveu sobre a célebre conferência de imprensa na banheira.
...
Assim, para o Ricardo, em agradecimento pelo seu utilíssimo trabalho, daqui lhe envio um fabuloso texto sobre Ribeiro de Melo:
"... dezenas de entendidos assistiram ontem à noite [dia 15 de Dezembro de 1971] ao entremez 'Um editor na banheira', representado por Fernando Ribeiro de Melo (Edições Afrodite) no seu rés-do-chão da Rua do Cabo, a dois passos de Santa Isabel. Quatro obras novas foram pretexto para a mais líquida conferência de imprensa de que temos memória ... [in Diário Lisboa, 1ª pàg. Do dia 16 de Dezembro de 1971]
"Porque pode ser Melo mas sobretudo porque é Ribeiro, o editor Fernando Ribeiro de Melo deu ontem à noite mais uma prova da sua compatibilidade com os líquidos ao fazer de dentro de uma banheira o lançamento de novas obras. Quando lhe perguntaram de ele sempre era ao Dali português, respondeu naturalmente:
'Cada povo tem o Dali que merece, embora alguns Dalis (é o meu caso) não tenham o povo que merecem. Mas enfim ...
'Neste 'enfim' ia uma banheira de sugestões (...) O editor entra na banheira, senta-se (leva calções pretos para obviar á pergunta 'vestiu calções?'), acende um cigarro, deita as primeiras cinzas num bacio (este branco, por contraste) e perora assim:
'Meus senhores, com a vossa colaboração espero a eficiência de uma comunicação ao público sobre estas obras que o público deve ler!
'Sabe-a toda, e sabe que a sabe toda (...)
A cena passou-se ontem, à noite, como dizíamos, numa banheira. Para sermos precisos, a banheira estava (e está) na Rua do Cabo, nº 10, rés do chão esquerdo, à direita de quem sobe. Quanto aos presentes, eram cerca de quatro dezenas, mas incluíram representantes de quase todos os órgãos de Informação da capital e até mesmo gente da Rádio, do Cinema e da Televisão. Se fosse no S. Carlos de Há cem anos teria sido um inapagável 'sucesso de binóculo'.
Algumas palavras acerca do editor: é de facto editor (edita livros), não sobressai pela estatura (relativamente meã), usa bigodes de ponta retorcida, anda pelos trinta, trinta e pico. Perde dinheiro, ganha dinheiro. Agora está interessado em ganhar, de onde a conferência de Imprensa na banheira com permissão de traje de passeio: era o que rezava o convite. Os livros são giros, anotamos o primeiro volume da História Trágico-Marítima de Bernardo Gomes de Brito (...)
Dois diabos ensonados misturavam-se com a assitência, enquanto duas beldades do conhecido editor (Palola e Eugénia) iam servindo e retirando o alvo bacio de louça. Num requainte de maladez publicitária Ribeiro de Melo pintara 'slogans' editoriais sobre a cútis das raparigas.
'Sinto que há entre nós muita falta de alegria', comenta ele (...)
Fui comido pela máquina fotográfica, casquina um verso de Mário Cesariny de Vasconcelos. A propósito, estava presente o Cesariny. E estava o Cruzeiro Seixas. E o Júlio Moreira. Entre as muitas outras pessoas que deixaram cartões ou de algum modo se fizeram representar anotámos os nomes dos srs. António Palouro, António José Forte, Vítor da Silva Tavares, José Vaz Pereira, Cuna Telles, António Damião, Nuno Júdice, Manuel Gusmão, Sam, João Paulo Guerra e Fernando Ribeiro de Melo. Que estava a ler (ler mais acima) dentro de uma Grande banheira circular forrada a preceito pelo artista plástico João Vieira. De calções pretos"
[F.A.P. (Fernando Assis Pacheco?), Diário de Lisboa, pag.2, 16/12/1971]

Sunday, September 03, 2006

Luiz Pacheco escreveu - I

"Em 1970 (com excepção da edição de Crítica de Circunstância, pela Ulisseia, em 1966, livro de imediato apreendido), eu não tivera nenhuma editora a sério quer me quisesse (não esqueço o labor honrorosíssimo do Fernando Ribeiro de Mello, na Afrodite: convidou-me para colaborar com ele na Antologia Erótica e como prefaciador da Filosofia na Alcova. Louvores e mais louvores para a sua coragem... Porém, que opinião era a minha em 1970 com as castigadoras condenações que aqueles livros acarretaram para quem ali meteu a patinha?)."
Jornal de Letras, Artes e Ideias, 12 Outubro 1994, pp. 17-18
(parte de um texto intitulado, De editor a editado)

"Vítor Silva Tavares quererá retomar uma experiência tipo Pauvert, com edições refinadas, com obras de clássicos desprezadas, de contemporâneos injustamente não divulgadas? Excelente coisa, mas não em exclusivo. O “nosso” Pauvert que já havia e era o Ribeiro de Mello, se em tempos do fascismo e com uma coragem que mais ninguém teve então, foi no campo editorial um contestatário a valer, verificamos que perdeu de todo a tramontana (que não era das mais sólidas, helás!...) e descambou na mais reaccionária e oportunista comercialice. Não havendo este perigo com V.S.T., que é o desinteresse feito gente, preferia sabê-lo (vê-lo) a encarar as responsabilidades que lhe imputa o muito que já fez. Noblesse oblige. Nem permitirei que uma camaradagem de anos faça calar em mim os avisos e as reprimendas a que por essa mesma camaradagem me sinta, como agora aqui, sem azedume nenhum, sequer no exagero de caricatura, obrigado. Disse."
O Galimar da Rua da Emenda – “Diário Popular”, 26/Fevereiro/1976
(parte de um texto sobre Vítor Silva Tavares, que em 1974 iniciou a actividade da editora & etc.)