Monday, October 30, 2006

O Pequeno Livro Vermelho do Estudante, de Soren Hansen e Jesper Jensen

edição de Outubro de 1977

Tradução: H. Medeiros
Revisão literária: J. Méco
Adaptação e notas: M. Alberta Menéres e Orquídea Martins
Colecção Guias
Edição e arranjo gráfico: Fernando Ribeiro de Mello / Edições Afrodite

Texto na contra-capa
Este livro originou polémicas à escala mundial. Tendo surgido numa democracia como a dinamarquesa, acabou por ser queimado em França e o seu editor (Máspero) foi preso e multado. Em Londres (Stage I) sofreu a multa de vinte mil libras esterlinas. Na Itália (Guaraldi) foi apreendido. Em contrapartida, estão em circulação as edições alemã, sueca, norte-americana, norueguesa, japonesa, canadiana, neo-zelandesa, australiana, islandesa, mexicana. Até hoje já foram vendidos mais de dois milhões de exemplares. Derrubando todos os tabus, são aqui esclarecidos da maneira frontal, clara e verdadeira, os problemas mais prementes, às vezes dramáticos, que se põem à juventude de hoje: sexo, droga, prostituição, conflito de gerações – em casa, na rua, nas escolas, nas relações sociais. Obra representativa do nosso tempo que era urgente em Portugal.

Saturday, October 28, 2006

Acerca da edição de 1966 da Filosofia na Alcova - Parte VII

David Mourão-Ferreira resumiu os argumentos já conhecidos do seu texto. O autor tinha “valor cultural” mas ele sentia repulsa pelos temas que era seu costume abordar e só tinha podido comprometer-se a escrever um prefácio contra Sade.
Herberto Helder, esse explicou que se desinteressara da tradução por razões várias, algumas delas pessoais, e acabara por entregá-la a outro. “Outro, quem?”, perguntara o Dr. Seia atrás dos óculos de aros grossos. “António Manuel Calado Trindade.” Perante a situação - um tradutor que não traduzira, outro que o fizera mas não a mando do editor – acabara por inventar-se um pseudónimo que conservava o Helder somando-lhe outro nome também começada por hagá.
Quanto a João Rodrigues, assumia tudo: já tinha lido a obra e aceitara fazer ilustrações subentendendo que se destinavam a uma edição em português.
No dia seguinte Calado Trindade (o novo interveniente no processo) era interrogado; e um mês depois, nas Caldas, Luiz Pacheco.
Calado Trindade (um estudante universitário com 22 anos que cumpria o serviço militar) nada tinha a dizer ao Dr. Seia que acrescentasse sabor novo à anedota do processo nem motivo de acrescida excitação. Sim, aquele trabalho fora-lhe proposto por Herberto Helder e aceitara fazê-lo; na altura não sabia a que editor se destinava mas admitira como objectivo a sua publicação.
O palco demorou um mês a deslocar-se para as Caldas. Com novo cenário, o Dr. Humberto Carlos Amado Gomes substituíra o Dr. Seia e o argumento aconselhava-se a mostrar grande interesse por antecedentes criminais que pesavam sobre o corpo magro do arguido.
- Já tinha – confirmava Luiz Pacheco sem hesitações – respondido duas vezes como réu: a primeira por estupro, a segunda por atentar contra o pudor e desobedecer ao Tribunal. Numa e noutra fora condenado. No que respeitava ao seu trabalho como prefaciador podia, sim senhor, dizer que escrevera o texto propositadamente para a edição portuguesa de A Filosofia na Alcova e chegara ao ponto de rever provas tipográficas do que lá tinha aparecido com a sua assinatura.
(continua)

Thursday, October 26, 2006

Insofrimento In Sofrimento, de José Carlos Ary dos Santos

edição de 1970
Colecção Sagir (poesia) – 2
2.ª Edição

Edição de Fernando Ribeiro de Mello
“Para a Natália Correia, à coragem
da sua inteligência, da sua poesia,
da sua amizade.”

Saturday, October 21, 2006

Do editor para o advogado


Um exemplar da Antologia de Vanguarda, valorizado com uma dedicatória de Fernando Ribeiro de Mello a Manuel João Palma Carlos, advogado do editor no processo relativo à primeira edição da Filosofia na Alcova.
Junto ao exemplar, seguiu também uma carta ao advogado, precisamente sobre “o processo do Sade”.

Fernando Ribeiro Bento de Mello


(Porto, 11 de Novembro de 1941 - Coimbra, 27 de Fevereiro de 1992).

Amigo de Natália Correia, Luiz Pacheco e outros intelectuais portugueses, um émulo de Salvador Dalí, foi o enérgico fundador das pequenas e excelentes Edições Afrodite, em 1965, que durante os anos finais do salazarismo causou escândalo e sensação em Lisboa, com a publicação de obras polémicas e proibidas, que conduziriam a diversos processos judiciais por ultraje aos bons costumes. Citem-se o Kâma-Sûtra - Manual do Erotismo Hindu (1965), a Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica (1966), de Natália Correia ou A Filosofia na Alcova (1966) do Marquês de Sade. No início dos anos 80, teve uma breve exposição mediática ao ter participado como membro do júri do concurso A Filha da Cornélia na RTP, juntamente com Alexandre O'Neill, Beatriz Costa e Maria Elisa.
As extintas Edições Afrodite desempenharam, nessas décadas, um papel ímpar na divulgação em língua portuguesa de diversos autores fundamentais da contra-cultura (André Breton, Alfred Jarry, etc.). Ribeiro de Mello teve a inestimável colaboração de grandes tradutores, antologiadores e ilustradores como Ernesto Sampaio, Aníbal Fernandes, Manuel João Gomes ou Eduardo Batarda. O trabalho de Fernando Ribeiro de Mello teria reflexo em editoras do mesmo tipo como a & etc dirigida por Vitor Silva Tavares ou a Hiena Editora.

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre
http://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Ribeiro_de_Mello

Wednesday, October 11, 2006

Extra catálogo Edições Afrodite

O Catálogo

Colecção Afrodite

Kama-Sutra: Manual do Erotismo Hindú, Séc. V d. c. - Vatsyayana, 1965

Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica: dos cancioneiros medievais à actualidade – Selecção, prefácio e notas de Natália Correia. Ilustrações de Cruzeiro Seixas, 1966


Tiragem especial de 500 exemplares da Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, em papel off-set, numerados de 1 a 500 pelo editor e rubricados pela autora

A Filosofia na Alcova - Marquês de Sade – Tradução de Helder Henrique (pseudónimo), prefácios de David Mourão-Ferreira e Luiz Pacheco. Ilustrações de João Rodrigues, 1966

A Vénus de Kazabaika - Leopold Von Sacher Masoch, 1966


Cara Lh Amas, Poemas eróticos e sarcásticos - E. M. de Melo e Castro, 1974


O Supermacho - Alfred Jarry, 1975

Antologia de Poesia Latina Erótica e Satírica, 1975


Poesia Portuguesa Erótica e Satírica dos Séc. XVII – XIX, 1975

A Filosofia na Alcova - Marquês de Sade – Tradução de Manuel João Gomes, 1976

Colecção de Autores Estrangeiros

Jonas ou o Amor Numa Baleia - Pierre-Henri Cami, 1966


Colecção Antologia

Antologia do Conto Fantástico Português, 1967, 1ª Edição

Antologia do Humor Português, 1969

Antologia do Conto Abominável, 1969

Antologia do Humor Negro – André Breton, 1973


Antologia, De Fora Para Dentro, 1973

Nova Recolha de Provérbios e Outros Lugares Comuns Portugueses, 1974, 1ª Edição


Antologia do Conto Fantástico Português, com revisão, anotações e prefácio de E. M. de Melo e Castro, 1974, 2ª Edição

O Sexo da Moderna Ficção Científica – Antologia de autores franceses, 1976

Nova Recolha de Provérbios e Outros Lugares Comuns Portugueses, 1986, 2ª Edição, com prefácio de Moisés Espírito Santo


Nova Recolha de Provérbios e Outros Lugares Comuns Portugueses, 3ª Edição, com prefácio de Moisés Espírito Santo

Colecção Clássicos

Arte de Furtar – Anónimo do Séc. XVII, 1970

Peregrinação – Fernão Mendes Pinto, 1971, 2 vol.

História Trágico - Marítima – Bernardo Gomes de Brito, 1972, 2 vol.

Grande Livro de S. Cipriano ou Os Tesouros do Feiticeiro – S. Cipriano, 1971, 1.ª Edição - Especial


Grande Livro de S. Cipriano ou Os Tesouros do Feiticeiro – S. Cipriano, 2.ª, 3.ª e 4.ª Edições

O Manual dos Inquisidores – Nicolau Emérico, 1972

O Processo dos Távoras: A Expulsão dos Jesuítas, Conselho de Ministros de D. José I, 1974


Sobre as Feiticeiras – Jules Michelet, 1974


Colecção Ensaio / Documentos


Nº 1 - Anti-Duhring: Ou a Subversão da Ciência pelo sr. Eugénio Duhring - Frederico Engels, 1971

Nº 2 - A Sociedade do Espectáculo – Guy Debord, 1972

Nº 3 - Teatro Vanguarda: Revolução e Segurança Burguesa – Fernando Luso Soares, 1973


Colecção Extra-Colecção

Aventuras de Alice no País das Maravilhas - Lewis Carrol, 1971, 1ª Edição


Apocalipse do Apóstolo João, 1972

As Crianças Falam, recolha e selecção de textos de Adriana Areal Calvet e Elsa Anahory, 1973


A Malcastrada - Emma Santos, 1975

Do General ao Cabo Mais Ocidental – Álvaro Guerra, 1976

Aventuras de Alice no País das Maravilhas - Lewis Carrol, 1976, 2ª Edição


Colecção Antologia de Vanguarda


4 Autores da Novela Portuguesa Contemporânea – Sá-Carneiro, Almada, Manuel de Lima, Luíz Pacheco, (s.d.)

Colecção Autores I

Alecrim, Alecrim aos Molhos... - José Martins Garcia, 1974


Textos Malditos - Luíz Pacheco, 1977

A Fome – José Martins Garcia, 1977

Rol de Cornudos - Camilo José Cela, 1978


Colecção Autores II

Lugar de Massacre - José Martins Garcia, 1975

O Uso e o Abuso – Armando Silva Carvalho, 1976

Revolucionários e Querubins - José Martins Garcia, 1977

O Encoberto – Natália Correia, 1977


Colecção Sagir (Poesia)

O Vinho e a Lira – Natália Correia, 1966

Insofrimento In Sofrimento, José Carlos Ary dos Santos, 1970


Outros

Erros Meus, Má Fortuna, Amor Ardente - Natália Correia, 1981


Peregrinação & Cartas – Fernão Mendes Pinto, 1989, 2 vols.


Colecção Cabra Cega (Infantil)

1 – Conversas Com Versos – Maria Alberta Menéres, 1968

2 – Afinal o Castelo Era Verdade – Júlio Moreira, 1968

3 – Os Quatro Corações do Coração – Ricardo Alberty, 1968

4 – Perrault Vai Contar – Maria Alberta Menéres,

5 – Histórias Com Juízo – Mário Castrim, 1969

6 – Giroflé Giroflá – Alice Gomes, 1970

7 – Histórias de Bichos em África – Tomáz Ribas, 1970

8 – Uma Rosa na Tromba de um Elefante - António José Forte, 1971

9 – A Nuvem e o Caracol – António Torrado, 1972

10 – Ulisses - Maria Alberta Menéres, 1972

11 – Pinguim em Fundo Branco – António Torrado, 1973

Colecção Documentos

Governo Fascista Português - Último relatório sobre a situação geral do país do ex-Ministério do Interior para a ex-PIDE-DGS, 1974 

26 Anos na União Soviética, notas de exílio do “Chico da C.U.F” – Francisco Ferreira, 1975 (2.ª edição e  posteriores)      (1.ª Edição)

O Processo das Virgens: aventuras, venturas e desventuras sexuais em Lisboa, nos últimos anos do fascismo, 1975

Dossier 2ª República: leis constitucionais, legislação ordinária, discursos oficiais, notas oficiosas, comunicados, proclamações, decisões, documentos. Compilação e introdução de José Pedro-Gonçalves, 1976 - 1.º Volume



A 3ª Guerra Mundial Já Começou – Jacques Bergier, 1977

Eu Pertenci à K.G.B. – Aleksei Myagkov, 1977

Sexo-Espionagem: a exploração do sexo pelos serviços secretos soviéticos – David Lewis, 1978


Direitos do Homem – Declaração Universal dos Direitos do Homem / Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 1977

A Vida Secreta de Adolf Hitler: do “dossier” mais bem guardado de Himmler... – David Lewis, 1978

Kontinent 1 – Os Intelectuais e o Poder Soviético - vários autores: Sakarov, Ionesco, Siniavski, Djilas, Soljenitsine, 1977

Kontinent 2 – Ditadura sem Proletariado – vários autores: Conquest, Graham Green, Maksímov, Ota Filip, Soljenitsine, 1978 (Tiragem com capa diferente)

Colecção Guias

Guia Prático do Trabalhador Português – Marcelo Curto, 1974

O Pequeno Livro Vermelho do Estudante – Soren Hansen e Jesper Jensen, 1977

Desmarxizar a Universidade – Jules Monnerot, 1978

Manual de Primeiros Socorros – Norbert Vieux e Pierre Jolis, 1984, 3.ª edição, 2 Vol.


Colecção Doutrina / Intervenção



Teatro Vanguarda, de F. Luso Soares

edição de 1973

 
Nº3 da colecção Ensaio/Documentos
Teatro Vanguarda, Revolução e Segurança Burguesa
Texto na contra-capa
Tendo começado pela ficção, F. Luso Soares interessa-se desde 1963 pelo Teatro e pelo Ensaio. A sua segunda peça, “A Outra Morte de Inês” – cujo espectáculo do Teatro Estúdio de Lisboa a crítica da especialidade violentamente recusou – revela uma dramaturgia didáctica, épica, brechtiana. No ensaio, investiga o materialismo dialéctico no domínio da estética. Director de publicações culturais e da colecção de Teatro “Cena Actual”, exerce crítica literária rigorosamente doutrinária ideológica, o que vem dando lugar a polémicas bem significativas.
Uma política cultural de índole sectária põe rigidamente em causa as relações entre o escritor e as ideologias. A reacção contra essa política apossa-se de tal ânsia de corrigimento que quase generaliza a ideia de que o artista tem de recusar qualquer vinculação ideológica. Este livro – na esteira de Lukács – reafirma o “partidarismo” como categoria inerente a todas as opções artísticas. Discurso dialéctico que denuncia factores de crise política, constitui documentário de uma polémica entre cultura e anti-cultura.

Saturday, October 07, 2006

Explicata e nota à tradução de Kama Sutra – Manual do Erotismo Hindú

Explicata (pelo editor)

Compromissos de tempo, obstáculos de língua, impurezas do texto francês, etc., impediram que esta obra revertida ao português, resultasse isenta de deficiências gramaticais e sintáticas de modo a proporcionar uma leitura que no nosso idioma fosse a interpretação impecável do original sanscrito.
Entende-se por sanscrito, a linear linguagem oriental que na época criou tal documento. Este trabalho para português, atendendo a que foi perturbado pela tradução francesa, já de si pouco escrupulosa à claridade do texto – tendo contudo sobre a maior parte das posteriores, quer nessa língua, quer em qualquer outra, a virtude de não ser expurgada – saiu com alguns defeitos próprios dos impedimentos atrás enunciados. A viabilidade desta edição estaria em risco, dado o seu carácter, caso não tivesse sido executada com extrema brevidade.
Desculpam-se aqui as mínima incorrecções, que efectivamente esta versão inclui, embora elas, por mais flagrantes, de maneira alguma afectem a compreensão literal do valor e do alcance, informativo, documental e estético, que através dos tempos classissisou o original.
O editor agradece a benevolência do leitor mais exigente e compraz-se em salientar, ser ele o primeiro a reconhecer esses erros inclusos, mas cometidos em prol de um propósito por demais urgente e inadiável no panorama editorial português.



Nota (pelo tradutor Nuno Bacelar)

Uma tradução do Kama Sutra é não só tremendamente ingrata e difícil de levar a cabo como – pelas circunstâncias especiais que dominam esta obra prima da literatura erótica Oriental – se torna quase impossível de respeitar na sua tessitura original sabendo-se, como se sabe, que toda a ética hindú se reveste de segredos e de mistérios tão fecundos e aliciantemente subtis que, penetrá-los é, pelo menos, como tentar penetrar nas ondas sobrenaturais do mundo ocultista.
Ao traduzirmos o Kama Sutra utilizamos a tradução francesa de 1925, de Isidor Liseux, dada a impossibilidade de nos socorrermos de outras traduções, porventura mais recentes.
Como se trata, porém, de uma edição completa e não expurgada dessa obra – daí a sua fidelidade ao texto original – resta-nos a certeza de que o leitor português ficará com uma noção mais perfeita do seu conteúdo.
Para concluir, queremos apelar ainda da boa vontade desse mesmo leitor, cientes como estamos de que esta tradução tem as suas falhas, ditadas pelas dificuldades provenientes das circunstâncias indicadas atrás.
Por sua vez, também a tradução francesa sofre dessa realidade: uma linguagem original, simbólica e exótica que aliada a um tema manifestamente oriundo da mitologia sexual, exprime-se em termos que a aproximam mais do “misterioso mistério” da poesia do que, propriamente, da secura árida da prosa.

Tuesday, October 03, 2006

A Malcastrada, de Emma Santos

edição de Fevereiro de 1975

Prefácio de Roger Gentis
Tradução de Eva Caldeira e Manuel João Gomes
Capa de Nuno Amorim
Extra-Colecção
Edição e arranjo gráfico de Edições Afrodite

Texto na Contra-capa
A escrita dos loucos.
A loucura escrita.
Como Nerval, como Artaud, como Jarry.
A escrita dos doentes contra os médicos.
Contra a repressão.
A escrita anti-normal. EMMA SANTOS.
Apesar do ensurdecedor falatório dos psiquiatras a loucura continuou felizmente a falar em voz cada vez mais alta na produção literária, poética e romanesca destes dois últimos séculos.
O Movimento de Libertação dos Loucos.
A luta da loucura contra a normalidade.
O desmascarar da Psiquiatria e instituições opressivas.
A condenação dos psiquiatras e quejandos.
A escrita anormal, da sub-humanidade.
A palavra nova anti-linguagem.
Como Holderlin, Nerval, Nietzsche, Jarry, Strindberg, Poe, Roussel, Faulkner, Artaud, Lowry, Emma Santos e tantos outros, todos chanfrados, esquizofrénicos, paranóicos, neuróticos, até à medula, cozidos e recozidos pelo álcool, bela amostra dessa sub-humanidade que de ordinário é despejada nos asilos.
Contra a sexualidade normal, contra a instituição familiar.
A escrita da mulher louca.
O Movimento de Libertação das Loucas.
O movimento anti-patriarcal.
A anti-psiquiatria, a contra-sexualidade. Uma palavra nova.

Sunday, October 01, 2006

Acerca da edição de 1966 da Filosofia na Alcova - Parte VI

Até que Henrique Parente, funcionário da Judiciária, em 29 de Março resolve apresentar serviço. Teve “a honra de informar “ superiormente, em folha timbrada, que “constava estar à venda e em circulação um livro pornográfico, protótipo da desmoralização, com o título A Filosofia na Alcova.” Era do marquês de Sade. E esclarecia: “tal livro, segundo consta, tem sido (sic) editado por Fernando Ribeiro de Mello, residente na Avenida António Augusto de Aguiar, 3, 2º letra A, nesta cidade”. (O bom agente é, como sabemos, perito em descobrir moradas.)
Datado do mesmo dia houve um despacho superior que não escondia, na letra, na economia das palavras, alguma irritação: “Passe-se imediatamente busca.”
Uma semana depois havia trabalho feito e boa se achava a ocasião – noutro reduto, paredes-meias com o centro do Poder – para serem solicitados mais serviços à diligente Judiciária. O Chefe das Secretaria da Direcção dos Serviços de Censura da Presidência do Conselho tinha a honra (também ele) de comunicar que A Filosofia na Alcova fora proibida de circular no país e aproveitava relembrar dois desacatos anteriores da mesma editora, nessa altura já apreendidos: Manual do Erotismo Hindu e Antologia da Poesia Portuguesa Erótica e Satírica. “Muito agradeço a colaboração prestada por essa Polícia a estes Serviços”, concluía ele, solicitando “o favor do envio urgente, de um exemplar de cada um dos referidos livros”. (Dizia-se, realmente, que S. Bento gostava de ler!)
Os movimentos que se concertavam em redor deste Sade com a ousadia de falar em português tornavam-se complexos. Dias antes, já o editor fora ouvido em auto de declarações pelo inspector Jorge Alberto Aragão Seia.
- Queria saber tudo – relembra Ribeiro de Mello. – “Quem é este tradutor Helder Henrique?” Tive de explicar que não existia nenhum Helder Henrique; a tradução fora entregue ao Herberto Helder, que não chegara a fazê-la por razões pessoais. Dera-a por sua vez a outro, meu desconhecido; aquele nome era um pseudónimo de minha inteira responsabilidade. “E os prefaciadores?”, “Convidei-os directamente a escrever um texto com aquele fim.” “E quem é este João Rodrigues, ilustrador? ” O Dr. Seia queria saber as moradas. “Não sei nenhuma morada”, respondi. “Posso encarregar-me apenas de contactar com eles.”
O interrogatório ainda não chegara ao fim.
- Senti que era dever meu declarar-me responsável único pela edição, feita com dinheiro que eu tinha e outro, emprestado. Mas o Dr. Seia não desarmava. “E a tipografia, quanto lhe levou?” “Ainda não sei.” “Em que livrarias o livro foi distribuído?” “ Não muitas, dadas as características da editora e da obra: em Lisboa a Sá da Costa, a Bertrand, a Divulgação, a Àtica, a livraria de Eduardo Rodrigues Pereira; em Coimbra a Almedina; outras na província, que ignoro.” “Quantos exemplares foram colocados?” “Não sei.” Mais tarde fui informado de que tinham sido apreendidos 1267 exemplares da edição de 2000. Para resumir, vi-me obrigado a contactar com os intervenientes explícitos e a dizer-lhes que fossem à Judiciária. Com excepção de Luiz Pacheco (na altura a viver nas Caldas), foram ouvidos na semana seguinte.
(continua)